05
março

Artigo – Por Maurício Romão


Modernização do estado e flexibilidade da estabilidade do servidor

 

Maurício RomãoA administração pública patrimonialista que predominou nas sociedades pré-capitalistas, pré-democráticas, particularmente nas monarquias absolutistas, tem como característica principal a indistinção entre o que é público e o que é privado. O aparelho do Estado funciona como uma extensão do poder do soberano: o patrimônio do príncipe se confunde com o patrimônio público.

 

A célebre frase de Luís XIV, “l’Etat c’est moi”, exemplifica bem esse contexto de apropriação privada dos bens públicos. Não sem razão que duas excrescências naturais pontificam no patrimonialismo: o nepotismo e a corrupção.

 

Os avanços da democracia e do capitalismo deram lugar à administração pública burocrática como modelo de proteção do patrimônio público e como instrumento de combate à corrupção e ao nepotismo. Seus alicerces são a profissionalização, a carreira funcional, a hierarquia, a impessoalidade, os controles, enfim, o exercício da autoridade racional-legal sobre o patrimonialismo, conforme destacou Max Weber.

 

A estabilidade do servidor público emerge naturalmente nesse contexto de salvaguarda, e no Brasil foi incluída na Constituição de 1934 e em todas as Cartas posteriores. O fundamento é preservar o servidor de pressões políticas, evitar dispensas discricionárias e garantir a continuidade dos serviços, mesmo com mudanças de governo.

 

Quando o Estado foi ampliando seu papel socioeconômico, a administração pública burocrática mostrou-se completamente inadequada. Para combater o patrimonialismo há que se desconfiar previamente dos próprios administradores públicos e dos cidadãos que lhes dirigem demandas. Daí ser necessária a instituição de rígidos controles administrativos a priori e a magnificação da importância dos processos em si.

 

Com tantos controles e alta prioridade em processos – e não em resultados – a administração tornou-se ineficiente, cara, centralizada e auto referida, voltada para suas próprias necessidades e perspectivas e não para o atendimento do cidadão, visto não apenas como simples contribuinte, mas, sobretudo, como cliente. O servidor ficou estigmatizado como símbolo da ineficiência do serviço público. O manto protetor da estabilidade seria a causa do descompromisso, da desídia e do mau desempenho.

 

Hoje em dia, em tempos de revolução nas comunicações, requer-se transformar estruturalmente o aparelho do Estado, adotando uma administração pública moderna, orientada por cultura gerencial, de eficiência e qualidade na prestação de serviços: descentralização decisória, forma flexível de gestão, horizontalização de estruturas, descentralização de funções, avaliação sistemática de desempenho do servidor, mas com recompensa e remuneração variável, etc. O carro-chefe é o controle a posteriori dos resultados com foco no cidadão-cliente.

 

Para atingir esse desiderato é essencial flexibilizar a estabilidade do funcionalismo público, preservando o instituto apenas para algumas poucas carreiras típicas de Estado, a exemplo do que ocorre em vários países do mundo moderno, como na Coreia, Dinamarca, Nova Zelândia, Finlândia, Reino Unido, Suíça, entre outros.

 

Obs: Texto publicado no Diário de Pernambuco, 28/02/2016, respondendo SIM à pergunta formulada pelo jornal: “você é favor da flexibilização da estabilidade do funcionalismo público?”.

 

As opiniões aqui expressas são de responsabilidade de seu idealizador

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

Notícias Anteriores


Meses Anteriores